terça-feira, 7 de agosto de 2018

A calibragem do todo e da parte

Introdução:
Desde o começo, o Devir Social tem um grande objetivo: provar que não existe nenhuma visão absoluta de sociedade, de modo que o esforço intelectual deva ser exercido não para definir objetivos finais, mas sim para encontrar meios de harmonizar o conviver da sociedade. Este objetivo foi estabelecido diante da observação de que a democracia não está exercendo seu papel de representar as transformações sociais de que o povo deseja, então diante disto, são estabelecidas algumas sugestões de ferramentas democráticas para que se melhore a democracia como um todo.

Inicialmente o Devir Social demonstrou um modelo de calibragem que se baseia numa interpretação do que seria a “liberdade, igualdade e fraternidade”, demonstrando como cada um destes elementos se relaciona com a calibragem de uma sociedade de modo geral. No entanto, o objetivo de hoje é trazer um novo modelo que pode, de maneira mais objetiva, traduzir a democracia como uma ferramenta de calibragem. Este modelo tenta, de algum modo, traduzir as calibragens que ocorrem na cultura e na economia em definições mais gerais, para então criar um plano de configuração no qual a política exerce o papel de determinar como a sociedade se configura.

O plano:
O plano de calibragem política é composto por dois eixos. O vertical é o que será chamado de eixo de sacrifício. O horizontal é o que será chamado de o eixo de interferência. Para entender melhor como estes eixos funcionam, é preciso entender o conceito de “todo” e “parte”. O eixo de sacrifício está relacionado com a cultura e seus processos de renovação, passando, inclusive, pela área jurídica. O eixo de interferência está relacionado com a economia e seus processos de calibragem, passando, inclusive, pelo poder que o executivo tem em interferir na vida individual das pessoas. Portanto, de alguma forma, este modelo já tem em vista as preocupações da reforma jurídica apontadas pelo Devir. Os conceitos de “todo” e “parte” darão condições para que se entenda o porquê desta afirmação.


O todo:
O todo pode ser considerado a forma de poder dominante de uma sociedade. Ele ocupa as posições de poder e é responsável por aplicar as ferramentas das massas sociais. Isto, porque, seu objetivo é manter a sociedade estável, controlando as transformações para que elas não ameacem sua posição de superioridade. Portanto, é lógico pensar que o “todo” tem o conhecimento e recursos para controlar o governo, a mídia e o capital, de modo a articular estas grandes ferramentas de poder para manter sua hegemonia cultural e econômica. Sua concentração de poder é construída através da retirada do poder do próximo através destas diferentes ferramentas. Portanto, embora o “todo” controle a todos, isto não significa que todos estejam satisfeitos. Pelo contrário, sempre haverá as partes insatisfeitas com o “todo”, buscando confrontá-lo, mostrar suas manipulações, contradições e oferecendo novas alternativas para as ferramentas de controle das massas sociais.

A parte:
É possível considerar a parte como todo grupo social que está em condições desfavoráveis diante da hegemonia do todo. Estes grupos são unidos por características econômicas ou culturais geralmente construídas através dos processos históricos. Sua característica principal é a não satisfação com sua posição social, o que os leva a buscar métodos para alterar o fluxo de poder. Embora haja diferentes “partes” envolvidas, a tendência, em uma sociedade em que o “todo” está sob pleno controle de seus poderes sociais, é que as “partes” se unam para fazer oposição ao “todo”. Por isto, de um modo geral, este modelo considera “a parte”, e não as partes, como aquele que exerce a pressão política sobre o todo para a alteração das relações de poder. Existe, no entanto, uma região crítica aonde o “todo” e a “parte” podem se confundir ou se tornar instáveis, geralmente em situações onde a democrática está revolucionando as relações de poder de uma sociedade pode meio de sua calibragem.

Eixos:
Antes de entrar nos eixos propriamente ditos, é preciso entender que ambos os eixos se referem a uma relação de poder entre as partes e o todo. No entanto, quando se entra na região do plano aonde a “parte” domina, seja no eixo de sacrifico ou no eixo de interferência, é possível, se não for entendido bem as possibilidades de configuração de uma sociedade, imaginar que a parte se torne o “todo”. Afinal, ela domina. Mas isto não inteiramente verdade, uma vez que as partes, mesmo possuindo o controle dos mecanismos de controle, podem não encontrar um elemento de unidade central, seja cultural ou econômico. Portanto, sua dominância será efetivada sempre através de negociação entre si e entre o todo, enquanto que o todo, por sua vez, consegue estabelecer esse elemento de unidade central. É possível pensar, por exemplo, no “todo” como um estereótipo ser humano médio de uma sociedade, no qual pelo menos 68% de seus indivíduos se identifiquem plenamente. As outras extremidades que fogem desta identificação são os diferentes grupos sociais da parte, por isso é possível supor que nunca haverá a harmonia que torna a parte no todo.

Eixo de interferência:
Este eixo dita, de um modo geral, o quão legítimo são as ferramentas que o todo pode usar para interferir na parte ou vice-versa, a depender de como se estabelece as relações de poder. Aqui a legitimação se dá através do estado, uma vez que é o estado que possui oficialmente o poder das forças de compensação e tributação, ou, em situações mais extremas, recompensas e punições. Portanto, é possível interpretar que este eixo responda a pergunta: “quem controla o estado?”. Se a parte, é possível imaginar um estado com muitos mecanismos de votação e, portanto, horizontal. Se o todo, é possível imaginar um estado com muitos mecanismos de hierarquia social e, portanto, vertical. Isto porque é possível imaginar que o todo age geralmente em concordância, portanto, naturalmente eles se organizam em hierarquia. Já a parte, por sua vez, age geralmente em discordância, portanto, é preciso resolver seus conflitos através de mecanismos de votação

Eixo de resistência:
Este eixo dita, de um modo geral, o quão a parte resiste ao todo e vice-versa. É natural assumir que quem tiver dominância do eixo de poder de interferência irá querer usá-lo a seu próprio favor. No entanto, ao aplicar esta força, é possível imaginar que quem estiver sofrendo a ação irá desenvolver alguma resistência. Este eixo, portanto, indica o quão forte é esta resistência e quem está resistindo a quem. É possível imaginar uma sociedade, por exemplo, em que o todo aplica força nas partes e as partes resistem pouco, ou vice-versa. Isto tem haver com o quanto cada uma destas forças acredita em sua própria força e encontra caminhos para alcançá-la, ou, de outro modo, o quanto cada uma destas forças está disposta a sacrificar a si mesma com o objetivo de não se submeter a quem está no domínio. Este eixo tem claramente um aspecto mais cultural, uma vez que é a cultura quem dita quais valores são suficientes ou não pra uma população agir.

A má calibragem:
A relação de poder entre o todo e a parte se dá através do ambiente, tecnologia e do contexto histórico ao qual elas estão inseridas. Isto porque o mais natural é se pensar que uma sociedade irá buscar, através da tentativa e erro, alcançar a configuração de maior eficiência e menor resistência. Afinal, se a parte que está submetida a uma força possuir as tecnologias necessárias para submeter à outra a seu próprio poder, a resistência dela será maior. Ou, de outro modo, se a sociedade não souber interferir de modo inteligente em sua própria economia e cultura, ela não será produtiva e sofrerá conseqüências na sua produção. Para tanto, é necessário que estas forças sejam calibradas através de maneira legítima, pois do contrário, toda luta entre estas diferentes forças passará pelo crivo da violência.

Por violência, entende-se tanto a violência natural quanto a violência no direito. Quanto menor for à legitimidade da calibragem, maior será a sensação de violência e corrupção ao qual um povo é submetido. Isto porque a criação de uma ferramenta legítima de calibragem implica em arquitetar as tecnologias conhecidas em uma sociedade através de um estado, em que este estado consiga aplicar as leis de modo que nem a resistência seja forte o suficiente ao ponto de justificar a autodestruição, como violência natural ou vícios destrutivos, nem a interferência seja forte o suficiente ao ponto de permitir que uma força seja absoluta em relação às demais. Isto é necessário para o bom desenvolvimento social, pois do contrário a sociedade não conseguirá se desenvolver de maneira harmônica e contínua.

Conclusão:
Se não desenvolvido melhores ferramentas de calibragem, todo processo de revolução significará em revoltas violentas. Isto é um absurdo para os países desenvolvidos, uma vez que cada ser humano não somente custa o preço de sua alimentação como em outras épocas, mas o preço de seus estudos e de diversos outros processos que o torna útil socialmente. Isto explica, por exemplo, o porquê os países desenvolvidos estão preferido guerras econômicas ao invés de guerras militares entre si. Por outro lado, se tratando da harmonia social interna dos estados, o que se observa que alguns países, geralmente os subdesenvolvidos, não conseguem encontrar um ponto de equilíbrio para seu desenvolvimento interno. Isto implica em situações de constante resistência e, ao mesmo tempo, constante corrupção.

A corrupção, como já dito, é uma violência em nível de estado. Isto significa que existem tecnologias e forças fortes o suficiente que não estão sendo levadas em consideração pelo estado e que conseguem ferir a ele. No final das contas, a resistência tem tecnologia para se manter resistente, mas não para se firmar em promover as transformações sociais necessárias porque a corrupção está constantemente minando o bom funcionamento do estado. Portanto, o maior desafio deste século é buscar um novo formato de estado, que consiga reunir todas as tecnologias conhecidas atualmente de maneira organizada ao equilíbrio das forças. Isto é imperativo para garantir alguma ordem mundial, pois do contrário, os países em desenvolvimento sempre buscarão consumir os recursos dos países subdesenvolvidos para manter satisfeita sua própria população, que de outro modo, entra em revolta, afinal, o próprio país não possui os mecanismos de calibragem necessários para que se mantenha a paz.

É neste sentido que o Devir Social aponta a reforma dos conselhos sociais, como maneira de fazer paridade com os sindicatos e o governo, assim como aponta a reforma do tribunal de júri, para que a própria população, através da votação, consiga harmonizar e imprimir as transformações que ela mesma acredita para si mesma. Afinal, se, por exemplo, imaginarmos que o “todo” é corrupto, mas ele se propaga através do estado e, por extensão, no poder jurídico, de que outra forma é possível reformar o poder jurídico, senão através da própria participação das partes? É possível argumentar que o legislativo é quem tem autoridade sobre o poder jurídico através da construção de leis. No entanto, a premissa do jurídico ser corrupto implica diretamente que o jurídico não respeita seu próprio estado, em conseqüência, não respeita a lei. É preciso que o próprio espírito do povo intervenha para harmonizar o país, e não há outra forma disto acontecer senão através do melhoramento das instituições democráticas.

Link no blog: https://www.facebook.com/DevirSocial/posts/886964811504542

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

Análise das autoridades segundo a linguagem dos organismos

Introdução:
Quando se busca alcançar um ideal sobre como as instituições de uma sociedade devem ser, sempre ocorrem divergências. Estas divergências geralmente têm haver com o modo que se deve tratar um indivíduo e quais ferramentas e quais autoridades serão responsáveis por isto. Há uns que defendem a liberdade, outros que defendem a igualdade. Como, entretanto, desenvolver uma visão capaz de comportar os diferentes olhares e atuações dos organismos sociais da nossa sociedade? Para isto usaremos a linguagem dos organismos como uma forma de analisar as principais autoridades da nossa sociedade atual e assim extrair os seus princípios de funcionamento e relacioná-las com o estado, a linguagem das linguagens.

Através da observação empírica do autor deste texto, serão classificadas em três as principais autoridades da nossa sociedade: a política, a científica e a religiosa. A autoridade política é aquela que governa a sociedade e possui o monopólio da violência, utilizando-se da linguagem do estado, que é uma construção histórica. A autoridade científica é aquela que desenvolve as tecnologias e se responsabiliza pelas construções das estruturas materiais da sociedade, exercendo influência sobre a economia. A autoridade religiosa é aquela que estabelece as premissas culturais de uma sociedade exercendo, portanto, uma enorme influência sobre a cultura. Este texto trabalhará em cima de um modelo ideal de sociedade contendo apenas estes três organismos.

Autoridade política:
A autoridade política é construída através do princípio eleitoreiro. Isto significa que o que as autoridades políticas fazem, afinal de contas, é ganhar votos. Na prática, a produção social da autoridade política se resume a duas: a negociação, quando se fala na manutenção de recursos da vida, e da promoção dos valores que a maioria das pessoas acredita, quando falamos da produção social que satisfaz a vida. Estas duas coisas objetivam que a autoridade política ganhe voto para continuar no poder, que é quando os indivíduos que estão nesta autoridade conseguem os recursos para a manutenção da sua própria vida e satisfação pessoal.

Acerca da produção social da promoção dos valores da maioria, é possível perceber isto de forma bastante reforçada através da promoção de festas, quando se trata de públicos cujo principal valor é o consumo natural, ou através da promoção de debates em torno de ideologias, quando se trata de públicos cujo principal valor é a produção de verdades naturais. Através disto se origina o processo de negociação aonde os grupos interessados por uma consequência específica de uma determinada visão investe ou não em um político. A linguagem política, por sua vez, comporta este tipo de ação, uma vez que a democracia permite a articulação entre grupos para a promoção de seus próprios interesses, que serão resolvidos através do voto.

Por ideologia, neste texto, entende-se o conjunto de premissas que pode ter origem ou em modelos naturais ou em modelos espirituais, mas cuja comprovação científica ainda não está determinada, seja porque não foi implementada, seja porque possuí características à elementos mutáveis, como a satisfação das pessoas. No entanto, cada ideologia interessa a um grupo em específico, e promovê-las significa modelar a sociedade para que beneficie mais a um que outro. Presumir uma ideologia que beneficie a todos igualmente seria assumir que todos são iguais materialmente e espiritualmente.

Autoridade científica:
A autoridade científica é construída através do princípio da busca pela verdade. Isto é feito através do método científico, que é um conjunto de técnicas que busca testar o quão falsa uma hipótese é. Por quanto mais testes científicos uma hipótese passa, menor a chance de ela ser falsa. No entanto, o que se prova é que uma ideia não é falsa, não que ela é verdadeira. Assim sendo, as autoridades científicas não devem ter o interesse de sustentar uma verdade, mas sim de promover a busca pela descoberta, para que o ser humano conheça cada vez melhor a natureza que está em torno de si. Obviamente, o método científico é um conjunto de técnicas da natureza, da matéria, podendo, portanto, somente ser aplicada para assuntos da própria natureza.

A produção social da autoridade científica é a tecnologia. Através dela, o ser humano obtém ferramentas mais eficientes para seu próprio desenvolvimento. Isto influencia na manutenção da vida já que algumas questões só podem ser facilmente resolvidas com as ferramentas adequadas. Por outro lado, a autoridade científica também é responsável por fomentar nas pessoas o interesse de descobrir. Afinal, se a ciência se reduzir simplesmente a desenvolver tecnologias, o conhecimento de base pode ficar estático e as tecnologias podem parar de evoluir. Portanto, a autoridade científica encontra satisfação em descobrir hipóteses que avancem na fronteira do conhecimento humano e que não são falseadas pelo método científico, sendo esta, também, uma produção social da ciência.

Assim sendo, é preciso que as autoridades científicas valorizem sua própria ética de funcionamento. Isto porque, sendo ela aquela que valida as verdades científicas, estando ela interessada em outros valores que não sua ética, é possível que verdades não tão científicas sejam divulgadas através dela, o que pode promover crise social à longo prazo. Afinal, é a ciência que valida, para o estado, as tecnologias que podem ser massificadas através do investimento público. O estado também se relaciona com a ciência através do financiamento, pois, sem desenvolvimento tecnológico, a produção da sociedade pode se estagnar.

Autoridade religiosa:
A autoridade religiosa é construída através das declarações de fé. Sendo fé premissas espirituais, ou seja, que não tem origem na matéria, é impossível aplicar o método científico na fé. Além disto, é impossível obrigar a alguém que siga sua própria fé já que ela precisa vir do interior do indivíduo. Do contrário, a fé se torna uma ferramenta social, podendo, portanto, se tornar passível ao uso de técnicas científicas e políticas. Se isto acontecer, haverá uma desarmonia entre a relação dos organismos sociais. O que se espera é que a autoridade religiosa promova sua fé, através da propagação da sua palavra, e que seu exemplo insira naquela pessoa a mesma certeza interna de que, aquilo que se anuncia, é verdadeiro.

A linguagem religiosa tem em si os mecânicos que garante sua própria manutenção da vida, e todos eles se baseiam no convencimento. Além disto, a produção social da autoridade religiosa é a adoração, o estado no qual os indivíduos encontram satisfação e paz interna. Para isto, no entanto, é preciso que os indivíduos inseridos na linguagem religiosa estejam de acordo com o que ela diz, o que produz um efeito material nos indivíduos como um todo, impactando na relação cultural entre os organismos. Desenvolver provas científicas para avaliar se um indivíduo está ou não de acordo com o que ele diz pode ser praticamente impossível. Portanto, o que vale é o testemunho interior de cada um.

Muitas vezes na história a religião se solidificou a tal ponto que dominou a política e ciência. Isto significa que ela desenvolveu ferramentas mecânicas de controle, que fazem com que os indivíduos profiram sua fé não por meio da revelação interna, mas por mecanismos externos que causam medo ou prazer, de modo a obter, através disto, o controle político. No entanto, modernamente, isto não mais se sustenta, uma vez que nosso desenvolvimento tecnológico chegou a tal ponto que controlar mecanicamente um indivíduo se tornou impossível, afinal, atualmente, uma sociedade cujos indivíduos não saibam ler, e, portanto, tenham autonomia, não tem condições de ter um alto nível de produção social quando comparada à outras.
  
Conclusão:
Na prática, é impossível separar completamente a influencia que uma destas autoridades tem sobre a outra. No entanto, entende-se que esta influência deva ser não-determinística. Isso significa que não existe nenhuma construção oficial de comunicação ou negociação entre um tipo de autoridade ou outra, porque uma vez existindo, isto adiciona autoridade no comportamento de ambas às autoridades, qualquer que forem elas. A própria história dá diversos exemplos de conflitos que surgiram ao tentar unir ciência, religião e política, em qualquer a combinação dois-a-dois. Cada uma destas autoridades tem um papel decisivo para o equilíbrio da sociedade e seus organismos, portanto, o estado reconhecê-los e incentivá-los de modo que eles façam bem seu papel e não permitir a construção de canais oficial entre eles é fundamental para uma sociedade equilibrada e harmônica.

Link no facebook: https://www.facebook.com/DevirSocial/posts/886964811504542

Linguagem dos organismos sociais

Introdução:
Esta construção nasceu através da observação dos grupos sociais e de como eles se consolidam. Houve a percepção que a “linguagem” é o principal meio pelo qual o grupo se torna coeso, mas para que haja uma linguagem, é preciso uma “autoridade” que a exerça para que haja uma “produção social”. Com a produção social, esse organismo se relaciona com a sociedade, obtendo seu sustendo e fornecendo sua produção à outros organismos, de modo que os membros da sociedade consigam se especializar para obter maior produtividade de um modo geral.

Assim sendo, houve o interesse de estudar mais precisamente o que significa “linguagem”, “autoridade” e “produção social”, de modo que, no final da análise, é possível perceber que estes elementos são suficientes para estruturar os organismos sociais e determinar suas características. Assim, será possível compreender sua função e delimitar com mais precisão o que é válido ou não na sua atuação por meio de seus indivíduos. O objetivo deste texto é, portanto, diminuir a confusão de quais operações efetuadas pelos organismos são ou não coerentes com sua construção e validadas pelo o que futuramente chamaremos de “linguagem das linguagens”.

Linguagem:
A linguagem é o instrumento de impessoalidade que os indivíduos utilizam para que um determinado comportamento possa ser propagado com eficácia e precisão. Afinal, um comportamento originado por um indivíduo, ao ser passado para outro, acaba recebendo imprecisões. Este outro, ao passar para o próximo, pode aumentar ainda mais a imprecisão de modo que, no final, o comportamento se altere tanto que o indivíduo o iniciou não o reconheça. Portanto, é a linguagem o elemento que mantém o grupo coeso e coerente, pois é através dela que também os comandos são dados pela autoridade para o corpo do organismo, para que ele se mobilize como necessário para atingir a produção social desejada.

A linguagem pode ser dividida em duas partes: a ética, que pode ser comparada a gramática, e a simbólica, que pode ser comparada ao dicionário. A ética é o conjunto de comportamentos que aquela linguagem consegue reconhecer. Uma vez reconhecida, a linguagem consegue determinar, através de suas regras, se aquele comportamento é aprovado ou não. Quando um comportamento novo é efetuado pelo organismo, a linguagem trata de observá-lo em relação a sua produção social para poder reconhecê-lo como aprovável, caso ele contribua para melhorar a produção social, ou reprovável, caso ele atrapalhe a produção social. Deste modo, a ética se assemelha bastante a gramática, pois ela diz como o organismo deve se comportar para que sua linguagem atinja seu objetivo.

A simbólica é a parte da linguagem responsável por comunicar aos integrantes sua identidade e seu modo de produzir dentro daquele organismo. Isto porque um organismo pode ser bastante complexo, contendo diversas especializações. É a linguagem simbólica que determina a responsabilidade de cada especialização para a produção social como um todo do organismo, de modo que cada integrante consiga reconhecer a necessidade da outra parte, de modo a aceitar a divisão de recursos com ele, embora só saiba, na prática, produzir aquilo que ele é responsável. Ou seja: enquanto a ética é uma regra geral sobre qual todo o organismo é submetido, sendo exercitada, o símbolo é utilizado para gerar consciência de unidade no organismo, sendo estático.

Autoridade:
A autoridade de um organismo social são os indivíduos responsável pela produção social daquele organismo. Esta autoridade é organizada através de hierarquia, aonde quanto mais ao topo, maior a responsabilidade da construção simbólica e ética da linguagem, enquanto que quanto mais à base, maior a responsabilidade pela construção mecânica da produção social. Sobre uma interpretação geral todos podem ser considerados autoridades, já que mesmo a base é sobre sua produção e precisa respeitar o comando de seus superiores. O topo é autoridade sobre outras autoridades e, embora não receba ordem, precisa respeitar a realidade para o bom funcionamento do organismo. Existem várias formas de mecanismos de governo como reinado, democracia, meritocracia, etc.

Toda autoridade tem o compromisso com sua produção e precisa receber recursos para sua própria manutenção. Assim sendo, a própria linguagem costuma ter mecanismos de distribuição de recursos, de punição, de recompensa e de promoção, para aqueles que mais se comprometem a conhecer, aprimorar e a realizar aquela produção social. A produção social que ela produz é o recurso de outros organismos, assim como os recursos que ela recebe é a produção social de algum outro organismo. Desta forma, idealmente, há negociação entre as autoridades para que seja justa a troca de suas produções de modo que a sociedade consiga viver em harmonia, sem que nenhuma autoridade carregue peso demais sobre si e de modo que todo organismo consiga prosperar, ou seja, seus indivíduos consigam utilizar os recursos adquiridos para desenvolver suas vidas de modo que os satisfaça.

Outro aspecto importante da autoridade diz respeito a sua capacidade de adaptar a linguagem para as variações ambientais que aquele organismo pode sofrer. Já foi escrito neste blog que a própria linguagem passa por um processo de evolução, através da sofisticação de seus símbolos e éticas em relação à produção social. Mas também é preciso levar em consideração que todo ambiente sofre alterações, tanto por fatores ambientais quanto também pela atuação de outros organismos sociais. Desta forma, é preciso haver um equilíbrio entre aquilo que a linguagem é capaz de descrever e aquilo que a autoridade é permitida criar. Do contrário, poderia haver a pretensão de que a linguagem fosse capaz de explicar tudo, mas quanto maior a precisão de uma linguagem, maior a sua complexidade e mais recursos são gastos para que ela seja estabelecida, exercitada e propagada aos demais indivíduos.

Uma autoridade é estabelecida através de princípios. Os princípios estão inseridos na ética da linguagem, e geralmente são os comportamentos mais básicos necessários à validação da produção social pela linguagem das linguagens. É permitido a uma autoridade criar, a medida da liberdade definida por seus superiores e desde que não se contradiga com nenhum princípio. Do contrário, se torna uma atitude antiética, de modo que não é válida, podendo trazer prejuízo ao organismo social como um todo, como a retaliação por parte dos outros organismos sociais ou a desorganização do equilíbrio da própria sociedade. Quanto maior o grau de autoridade, maior deve ser a responsabilidade para com os princípios, pois maior também é a liberdade de criação.

Produção social:
Todo organismo social é formado por indivíduos unidos por uma linguagem com o objetivo de obter alguma produção social. Esse organismo social pode ser composto por um indivíduo ou milhares. Cada indivíduo é um ser humano, portanto, tem necessidades a serem cumpridas, como por exemplo, a manutenção da sua vida. Em especial, existe uma necessidade a ser alcançada, que é a satisfação de sua existência. Portanto, toda produção social está relacionada ou com a manutenção da vida ou com a satisfação da existência humana. Deste modo, todo organismo social deve ser capaz de obter uma produção social, para que com ela, ele possa estabelecer relações com os demais organismos a fim de obter os recursos necessários para suprir a si próprio.

Um exemplo básico pra entender isso é se pensar um organismo que é especializado em produzir manutenção da vida, outro especializado em produzir satisfação de existência. Um sem a produção social do outro não existiria. De igual maneira acontece na sociedade, porém, com um nível de complexidade muito maior. As técnicas e ferramentas utilizadas pelos organismos para que eles produzam fazem parte do dicionário, assim a própria linguagem instrui no processo de produção. A cada nova tecnologia descoberta pela sociedade possibilita o processo de renovação dos organismos, através da modernização da linguagem, que nada mais é que atualizar a linguagem para dar suporte as novas tecnologias e, assim, haver um ganho de produtividade. No entanto, é preciso também levar em consideração as questões éticas da linguagem, uma vez que novas tecnologias implicam em novas relações, que podem não ser saudáveis para o corpo do organismo como um todo.

organismos sociais e a moral:
Este modelo de análise dos organismos sociais permite uma interpretação própria acerca do que é moral, que se segue: moral é a relação entre aquilo que uma autoridade anuncia e sua produção social. Isto significa que, se alguma autoridade der algum tipo de ordem ou de informação e sua produção social de algum modo indica que ele tem verdade naquilo que ele diz, então ele tem moral no seu anuncio. Se, por outro lado, sua produção social demonstra que aquilo que ele diz não é verdadeiro, então ele não tem moral. Pode ainda ser o caso de algum anuncio ser isento de moral, uma vez que não seja possível estabelecer ligação entre a produção social e o anuncio. No entanto, é possível assumir que tudo que um indivíduo fala tem como objetivo transformar alguma coisa, e se aquele indivíduo deseja transformar através do que ele diz, é porque ele tem alguma fonte de informação que o indica que aquilo é possível. Portanto, toda comunicação deve ser passível de análise moral.

O estado e a linguagem das linguagens:
Diante da complexidade dos organismos sociais, é preciso organizá-los em torno de seu território geográfico de modo que não ocorram abusos e nem exploração insustentável dos recursos naturais daquele território. Afinal, havendo demais abusos de um organismo em relação aos demais, pode ocorrer revoluções. Já se houver exploração demais pode haver falência daquele território. Portanto, com o objetivo de estabelecer uma relação harmônica entre os vários organismos, é comum observar, através de diversos processos históricos, o surgimento daquilo que chamamos de estado, cuja linguagem é chamada de “a linguagem das linguagens”.

Este nome é dado porque o estado contém em si os mecanismos para estimular ou desestimular qualquer outro organismo dentro do seu território. Não somente isto, como também tem o potencial de incentivar a criação de novos organismos mediante as necessidades futuras. Assim, é um organismo que se relaciona com os demais, calibrando-os para o bem comum da sociedade através dos dispositivos da sua linguagem. Isto significa, também, que a produção social do estado é regular a produção social dos outros organismos sociais. No estado representativo democrático, todo cidadão é uma autoridade cuja produção social básica é o direito de voto. Através das eleições, autoridades representativas são escolhidas e assim a estrutura hierárquica é construída.

No entanto, através disto, é possível perceber que um mesmo indivíduo pode fazer parte de vários organismos sociais. Ou seja: ele tem a capacidade de múltipla produção social. Parte do seu dia, por exemplo, ele pode se dedicar a produção social de manutenção da vida, outra parte do seu tempo ele pode buscar colaborar com a produção do seu estado. Nos fins de semana, ele pode satisfazer-se, consumindo a produção social que satisfaz a vida. Assim, este texto entende que todo indivíduo, numa visão moderna de sociedade, possui várias responsabilidades. Quanto maior for sua responsabilidade para determinado a gente social, espera-se que menor será sua responsabilidade para os demais organismos. Porém, de algum modo, é possível pensar que cada indivíduo se relaciona com todos os organismos sociais, nem que seja através da sua relação com o estado.

Um questionamento que surge é o seguinte: existe alguma produção social que não faz parte da linguagem das linguagens. Se sim, como ela existe? Afinal, se ela for muito benéfica à sociedade, é natural que o estado buscará estabelecer uma relação com ela. Se ela for maléfica, naturalmente, o estado irá combatê-la. Se, porém, o estado mantém alguma produção social, mas esta produção social em nada contribui para sociedade, o natural é que o estado pare de mandar recursos para tal produção, de modo que ela acabe morrendo. No entanto, se aquela produção social for importante para o estado, ou seja, para manter o equilíbrio entre todos os demais organismos, mas o estado para de nutri-la, então todos saem prejudicados.

Neste último caso se fundamenta a importância do estudo histórico dos organismos sociais, uma vez que é possível que haja organismos que sejam importantes para manter o equilíbrio da sociedade, mas que, por si mesmos, não conseguem existir. O estudo da história destes organismos é necessário porque uma população que não entende o porquê de determinada instituição naturalmente irá desejar que ela seja descontinuada. No entanto, sua descontinuidade representa um retrocesso social, uma vez que existiu um fato que motivou sua criação. Por isto a importância de ter uma linguagem das linguagens, que contenha em si também os aspectos históricos, e que isto seja amplamente conhecida por todos os cidadãos, que, afinal, são as autoridades do estado.

A linguagem das linguagens e a corrupção:
Para esta abordagem de organismos sociais, corrupção é toda linguagem de linguagens que não é o estado. Ou seja: todo organismo cuja produção social é beneficiar ou prejudicar outros organismos sociais e que não se submete a linguagem do estado é um organismo corrupto. Isto porque ele esta exercendo a mesma função que o estado, no entanto, sem a permissão clara dos demais organismos. Isto implica que um determinado organismo pode contratar os serviços desse organismo corrupto para beneficiar a si próprio em detrimento de vários outros organismos, que se prejudicam e não sabem o porquê. Isto claramente leva a cenário caótico e selvagem, já que os organismos começam a desenvolver a desconfiança uns pelos outros, começando a preocuparem-se mais com manter a segurança de suas produções do que em produzir propriamente aquilo que são responsáveis.

Ainda, devido ao clima de desconfiança, o estado começa a perder sua credibilidade e mesmo sua própria produção. Este enfraquecimento do estado implica em uma menor capacidade de sua produção social, seja articulando, punindo ou beneficiando os demais organismos, mediante ao necessário para o bom desenvolvimento de todos os indivíduos daquele território. Isto gera um clima de desconfiança e desunião, e logo as pessoas começam a entrar num estado anárquico, pois a linguagem das linguagens não é mais capaz de uni-las em torno de seu território. Em outras palavras, o estado perde sua moral. Com a moral do estado em baixa, com a produção social dos organismos menos eficazes, é natural que o clima de insatisfação comece a se instalar. Se nada for feito, pressupõe-se que esta sociedade entrará em crise, passando por grandes revoltas e possivelmente guerras civis.

Conclusão:
Através deste material, espera-se que fique claro a importância de entender melhor como é importante que todo indivíduo tenha consciência da produção social de todos os organismos da sua sociedade. Além disto, aqui foram lançadas as bases teóricas para futuramente analisar algumas autoridades de modo que pode ser muito útil para a resolução de certos conflitos éticos da nossa sociedade atualmente. Através da organização conceitual das autoridades, suas linguagens e produções, a saber, a política, a religiosa e a científica, espera-se que haja muito mais harmonia na construção dos organismos sociais da sociedade, de modo a promover uma melhor satisfação a todos que nela estão inseridos.

Link no facebook: https://www.facebook.com/DevirSocial/posts/886642791536744

sábado, 16 de junho de 2018

Devir Social e a relação entre estado e mercado

Muito se fala acerca da capacidade do mercado de calibrar as relações sociais que atuam em uma sociedade. Ainda, defendem que o estado deve ser mínimo, de modo que todas as relações sejam, de fato, resolvidas através da lei da oferta e procura. Assim, espera-se que a dinâmica entre os agentes seja inteiramente determinada pela própria capacidade do agente desenvolver relações e cumprir os acordos estabelecidos, sendo papel do estado somente a manutenção destes acordos e garantir as necessidades mínimas do funcionamento de uma sociedade. O Devir Social, no entanto, se opõe a esta visão, já que ele defende que a resposta para os problemas que acontecem atualmente é o avanço nos métodos democráticos. Porém, o texto de hoje buscará trazer reflexões sobre alguns problemas trazidos por esta visão.

Para começar, é preciso refletir o que torna ou não um país relevante geopoliticamente, e a importância desta relevância. A começar pela importância, é preciso fazer algumas definições filosóficas acerca do viver humano e as conseqüências sociais disto. Primeiro, o ser humano vive para realizar seus desejos, e todo desejo tende a ser construído através das relações de poder. Isto significa que todo desejo humano é tende a alcançado através do poder que ele exerce em outros seres humanos. Esta definição é importante para explicar o porquê um país tem a necessidade de ser relevante globalmente. Segundo, é preciso que construir um processo de continuidade para a realização dos desejos. Afinal, de nada adianta realizar um desejo, sem que este desejo dê condições de que se continue a realizar os desejos, e isto é feito também através da construção das relações de poder. Portanto, munidos destas afirmações, é possível refletir acerca da importância da relevância de um país.

Devido a cada vez maior capacidade tecnológica do nosso mundo, os países estão cada vez mais globalizados. Isto significa duas coisas: a primeira é que a noção de desejo é globalizada através do fluxo de informações, a segunda é que, para um país realizar a noção de desejo uma vez globalizada, ele precisa submeter os outros países à sua agenda de realização de desejos, ou seja, ele precisa estabelecer relações de poder benéficas a ele. Desta forma, é possível visualizar um país que, ao conseguir dar para a população aquilo que ela imagina ser a felicidade, consegue manter seu estado estabilizado, com as pessoas pagando impostos, para que ele mantenha pressão nos outros estados menores para que estes sirvam a ele. Estes outros estados, por sua vez, sempre enfrentam problemas de instabilidade, como corrupção, violência ou revoltas, mas por não ter condições de atender o ideal de felicidade das pessoas, nunca consegue se estabilizar.

Visando este cenário, torna-se claro que é necessário tornar um país relevante. Portanto, um dos pontos de reflexão já foi refletido. O segundo é acerca do que torna um país relevante geopoliticamente. Para começar, é necessário que o país tenha condições de produzir algo. No entanto, surge a seguinte pergunta: quem arca com a responsabilidade de produção? No ponto de vista do liberalismo, a resposta é a iniciativa privada. Mas o Devir tem duas objeções acerca desta resposta. A primeira é quanto ao desenvolvimento da produção, quem assume tais riscos? A segunda é acerca do poder da iniciativa privada: como calibrar algo que inevitavelmente se tornará maior que estados?

Assumir o risco de desenvolver um processo de produção é algo muito sério. Isto porque é preciso supor que toda produção efetiva já deve ter sido apropriada por algum país ou empresa, de tal modo que se um país precisar iniciar um processo de produção, é porque ele tem a responsabilidade de inovar em algum aspecto para ganhar algum tipo de relevância. No entanto, todo processo de inovação implica em investimentos que não necessariamente seja garantido retorno, pois, afinal, se há a garantia de retorno, é certo que algum agente já se apropriou daquela forma de produção para realizar seu poder. Sendo assim, a pergunta realmente válida a ser feita aqui e levando em consideração todo este contexto é: quem vai assumir o risco de produção?

No entendimento do Devir, não é possível que nenhum agente privado assuma este risco de produção. Isto porque, o bem que o desenvolvimento de um processo de produção traz necessariamente é global, portanto, deve ser global também a distribuição dos riscos, coisa que claramente não acontecerá se a iniciativa for privada. Aqui surge a seguinte pergunta: por que o bem do desenvolvimento de um processo de produção necessariamente é global? É possível supor que o agente que possui um processo de produção irá guardar o segredo de como produzi-lo. No entanto, é preciso levar em consideração que, uma vez que determinado conhecimento científico tenha sido produzido por um agente, a exibição daquele resultado, por mais indireta que seja a forma, vai dar pistas acerca do processo de produção, mesmo que seja por espionagem ou engenharia reversa.

Assim sendo, para o Devir, é claro que quem deve tomar a responsabilidade para iniciar um processo de produção é o estado. Afinal, não é um agente por interesses egoístas que irá assumir o risco de buscar um novo processo de produção, mas sim um agente que vê como única alternativa de sobrevivência sacrificar a vida que há em si para atingir seu objetivo. Neste caso, quem irá se sacrificar é o próprio estado, e as pessoas que compõe aquele estado, com o objetivo de trazer algo de benéfico para sua nação, que irá se perpetuar por algumas gerações. Afinal, se o estado não fizer isto, certamente ele não alcançará nenhum tipo de relevância geopolítica. Sem esta relevância, ele estará condenado a uma população infeliz, que não realiza aquilo que ela entende como desejo, por conseqüência, sempre estará imersa em um clima de corrupção, violência e rebeldia.

Finalizadas estas duas reflexões acerca da relevância do mercado em detrimento do mercado, prossigamos refletindo quanto ao poder da iniciativa privada. É possível elogiar a iniciativa privada como aquela que tem excelente resolução em termos de engenharia para um problema. Ou seja, ela consegue articular tudo o que se conhece para resolver um problema em específico. No entanto, em detrimento disto, ela peca na resolução de problemas em termos científicos, ou seja, dado que um problema existe, mas não existe conhecimento para atacá-lo, é preciso desenvolver tal conhecimento. Isto é, certamente, um papel adequado para o estado por motivos anteriormente já citados.

No entanto, ainda é possível argumentar que os agentes do mercado vão se articular para desenvolver a ciência necessária. Aqui surge o seguinte questionamento: o que diferencia a articulação de agentes de mercado de um poder alternativo ao do estado? Afinal, se os agentes do mercado se articulam, existem duas implicações possíveis: ou existe um interesse maior que o lucro, ou existe a tendência ao monopólio. Se no primeiro caso, que interesse seria este e por que este interesse está recaindo sobre agentes do mercado, não sobre agentes do estado? Isto seria uma construção correta do poder? No caso do segundo: não é o monopólio aquilo que destrói a função social do mercado? Afinal, o principal argumento para adoção do mercado como principal entidade de calibração social é que ele fará com que seus agentes sociais, através da competição, encontrem soluções ótimas.

Além disto, é preciso observar algo extremamente impactante quando observamos a iniciativa privada frente à globalização: as organizações privadas se tornam maiores que estados. Ora, se o estado democrático é construído como forma de equilibrar o poder, através do voto, como então equilibrar o poder destas organizações privadas? De certo modo, se a iniciativa privada é maior que estados, é possível supor um cenário onde não os estados, mas sim as iniciativas privadas compitam entre si para saber quem detém mais poder. Pelo princípio liberal, isto parece benéfico. Afinal, empresas competindo por um mesmo competidor vão apresentar melhores soluções. No entanto, ao lembrar a falta de um estado forte o suficiente para impedir manobras maliciosas, é possível supor que, no final das contas, o consumidor será sim lesado. Não somente isto, mas também qualquer estado que se impor para diminuir o lucro de uma empresa internacional em benefícios da sua própria população sofrerá as devidas retaliações.

Portanto, é preciso perceber o seguinte: as necessidades políticas naturalmente encontraram uma solução que equilibra o poder do mercado, dos estados e da população com pesos e contramedidas. Afinal, o mercado serve à população através do dinheiro, mas é regulado pelo estado. O estado serve a população através do voto, mas é limitado pelo financiamento das campanhas. Já a população se serve de ambos, mas também controla a ambos através do voto e do dinheiro. Portanto, defender que o mercado artificialmente deva ser maior que o estado somente supondo que o mercado terá condições de equilibrar todas as características da sociedade ao longo do tempo é, primeiro, arriscar uma população à uma hipótese que pode não se adequar a aquela realidade e, segundo, desvalorizar gradualmente o valor do voto em detrimento ao valor do dinheiro. Em última instância, é fazer uma sociedade que pense mais no consumo que na organização e produção, visto que não é possível inovar sem investimentos em ciência e sacrifício por sua nação.

Assim o Devir Social finaliza este texto, apontando que a solução para nosso período histórico não é diminuir o estado de maneira cega e ignorante, mas sim prezar pelo aperfeiçoamento dos métodos democráticos. O Devir espera que, através disto, a responsabilidade da produção social seja mais distribuída entre as pessoas, de modo que cada uma delas tome consciência de seu próprio contexto e da sua própria existência ao ponto de haver uma reconfiguração acerca daquilo que elas consideram realização de poder. Atualmente, realização de poder é ter padrão de consumo alto. O Devir Social um dia espera que realização de poder seja tomar decisões de alto impacto na sua sociedade, de modo a torná-la mais viva eficaz e menos dependente de modelos rígidos e imprecisos. Sem o aperfeiçoamento dos métodos democráticos, o Devir Social considera que a realidade não se alternará, independente de que se for o estado ou o mercado que esteja grande.

Link no blog: https://www.facebook.com/DevirSocial/posts/840266456174378

sábado, 2 de junho de 2018

Princípios adicionais aos conselhos sociais

Bem vindos a mais uma postagem do Devir Social. O texto de hoje traz alguns princípios  adicionais ao modelo de conselho social descrito anteriormente neste blog, para que, através deles, a percepção acerca de como os conselhos sociais devem funcionar, segundo o Devir Social, seja aprimorada. Estes princípios são construídos através daquilo que o Devir Social entende como uma relação de poder saudável e está ligado intimamente com todos os outros dispositivos de uso de poder já reconhecidos ou descritos neste blog. O modelo pode ser visto no seguinte link: http://devirsocial.blogspot.com/2016/12/devir-e-os-conselhos-sociais.html Sem mais delongas, vamos à eles.

- Princípio da sensibilização social:
Para manter uma sociedade viva, vários setores sociais são construídos. Alguns lidam com a saúde, outros com segurança, outros com alimentação, assim por diante. No entanto, o que fazer quando algum destes setores começam a falhar com um ou outro indivíduo, levando-o ao sofrimento? Certamente ele buscará formas de mudar esta situação. Uma destas formas é buscar a justiça para ser ressarcido do seu prejuízo, no entanto, isto pode não ser o suficiente para justificar o sofrimento que aquilo trouxe a ele. Deste modo, é possível supor que ele irá buscar maneiras de alterar a forma como aquele setor funciona, seja negando-o, buscando formas de nunca mais precisar se precisar dele, seja trabalhando como voluntário ou fazendo doações , ou, para o Devir Social, participando do conselho social que atende à aquele setor.

Portanto, para o Devir Social, o princípio da sensibilização social diz que se existe uma área da sociedade está funcionando mal e as pessoas não encontrarem outra alternativa senão a de participar do conselho social, então este conselho deve ser capaz de suportar aquela demanda. É desta forma que o Devir Social garante que todo aquele que tem algo para contribuir com aquilo que é público encontrará seu espaço, através do conselho. Assim, espera-se que cada pessoa que tem dentro de si o sentimento de ajudar ao próximo ou seja sensibilizada a tal coisa por algum ato de injustiça ou acidente encontre um meio verdadeiramente legitimo e direto de fazê-lo, proporcional à seu interesse e sua capacidade política e integrado à visão democrática de distribuição do poder político.

- Princípio da liderança de informação:
Uma vez que os conselhos comecem a funcionar, é possível esperar um bom nível de simetria na distribuição de informações, afinal, tudo feito de forma oficial no conselho será público. No entanto, nenhum sistema é perfeito, por isso é impossível garantir a distribuição plena de informação. Seria possível fazer muita coisa para integrar este fato ao desenvolvimento dos próprios conselhos, no entanto, o Devir Social entende que é suficiente estabelecer que é moral e justo que cada conselheiro lute pela sua aquisição de informação, e use aquela informação como bem entender. Fazemos isto através do princípio da liderança de informação, que diz que uma das recompensas por quem se esforça em mais participar do conselho é ter a liderança acerca da aquisição de conhecimento de uma informação ou outra.

Isto, a princípio, pode parecer estranho, pois parece que alguma informação importante pode ficar retida entre os conselheiros. No entanto, é preciso lembrar que conselheiros são eleitos através de votos e por isso existe uma responsabilidade de dar respostas à aqueles que votaram neles. Além disto, todos os conselheiros atuam sobre uma mesma realidade geopolítica, portanto, é possível presumir que se um dos conselheiros obtiver uma informação muito boa a ponto de privilegiá-lo em algum aspecto, logo os outros perceberam e buscarão por esta informação também. Portanto, fazer uso com sabedoria destas vantagens que o conselho pode trazer para cada conselheiro faz parte da dinâmica de poder trazida pela política. Embora possa parecer, isto não se configurará como corrupção, uma vez que o princípio da liderança de informação garante que isto é algo moral dentro do contexto dos conselhos, afinal, este princípio anuncia claramente que todos podem fazê-lo.

- Princípio da não autonomia financeira:
Imagina-se o seguinte cenário: um grupo de pessoas consegue, através da lei, o poder de taxar outras pessoas e ficar com os impostos. Estes impostos são destinados a um propósito nobre, por isso mesmo a lei permitiu que eles fossem autorizados, e também as pessoas que participam deste processo são todas eleitas por algum processo democrático, em especial o processo de votação estabelecido para os conselhos sociais, pelo Devir Social. Ora, algum desavisado poderia apontar para isto como algo bastante frutífero, uma vez que já sabemos que, de acordo com as propriedades já descritas no modelo dos conselhos de autocalibragem, poder-se-ia confiar que a possibilidade de algum sistema corrupto se instalar seria baixa.

No entanto, isto não é verdade. Afinal, nada garante que o recurso vindo através da taxação ao próximo seja realmente efetivado ao seu propósito, mesmo que exista um sistema de calibragem, e que os agentes que participam das decisões não entrem em acordo para manter assim. Portanto, este princípio é apenas um aviso de que este formato de conselho social não tem potencial de substituir o atual sistema legislativo ou executivo, apenas de co-participar com eles da construção democrática. Assim sendo, todo recurso vindo do conselho terá de ser negociado com o legislativo, pois ele é resultante de uma complexa estrutura de relação de poderes. No entanto, o Devir entende que existirá força nos conselhos para fazer isto,afinal, ele é construído através do voto, o mesmo voto que define o legislativo e executivo e, portanto, tem um imenso poder político.

- Princípio da não automação dos conselhos:
Todo processo deliberativo é único. Afinal, a cada deliberação há seu próprio contexto de interesses, situações, agentes e conseqüências. Um conselho, fundamentalmente, é construído para trazer vida à processos muitas vezes burocráticos e para que, através da participação social, a democracia responda com mais velocidade, sensibilidade e precisão à sua própria realidade. Portanto, este princípio diz que o trabalho de um conselheiro nunca deve ser repetitivo ou burocrático. Por outro lado, seu trabalho deve ser deliberar emprestando o componente humano à situações construídas através de mecanismos que possam ser distantes daquela realidade e muitas vezes mecânicos.

Obviamente, todo conselheiro deve saber que ele precisará efetuar algum trabalho durante seu processos deliberativo. Este trabalho será feito através de estudos, pesquisas, fiscalizações, estabelecimento de contatos e dentre diversos outros. Porém, não é atribuição do conselheiro fazer trabalho repetitivo ou decisões repetitivas. Portanto, todo trabalho ou decisão que se mostre repetitiva dentro de um conselho deve, idealmente, ser transferido para alguma instancia de poder público competente ou, se não houver, criá-lo. Como mencionado anteriormente, o Devir Social entende que os responsáveis pelo dinheiro são o legislativo, no entanto, através da pressão vinda da necessidade dos conselheiros de não ter seu tempo tomado por processos repetitivos, é esperado que o conselho consiga forçar que o legislativo libere, através da lei, os recursos necessários para criar cargos públicos para lidar com tais situações. Assim, terá ele a função de fiscalizar tais cargos, uma vez que, não trazendo ela retorno ao legislativo, é possível também que haja corte de investimento.

- Princípio da continuidade do cargo
Nos sistemas democráticos, os cargos eletivos costumam ter um limite de reeleição de um indivíduo. Isto funciona como uma tentativa de fazer com que o poder não se concentre nas mãos de pessoas, mas sim em ideias. Afinal, se uma pessoa é eleita a um cargo, em uma democracia, ela representa um conjunto de pessoas que se unem em torno de ideias, e assume-se que qualquer uma destas outras pessoas também tem tantas condições quanto ela para se eleger e representar. No entanto, este mesmo princípio não vale para os conselhos sociais, uma vez que, ao contrário dos poderes tradicionais, onde quem está no cargo se beneficia pela estrutura fixa de poder, em um conselho é possível pressupor que isto não acontecerá devido ao mecanismo de calibragem de poder.

Além disto, é preciso lembrar que, como dito anteriormente, espera-se que a participação do conselho seja voluntária, de tal modo que quem faça parte do conselho, o faça devido ao princípio da sensibilização. Assim sendo, é preciso verificar que existem custos para participar de um conselho, como, por exemplo, aprender a dinâmica, construir as relações ou  conhecer as leis, e este custo necessariamente é pago por um indivíduo e não pode ser transferível. Portanto, além de não existir motivos para impor limites de participação de um conselho, além disto, adicionaria um entrave a quem deseja participar de um conselho por alguma sensibilização específica, pessoal e muitas vezes intransferível, como também um custo cada vez que fosse necessário tirar uma pessoa que quer participar para adicionar alguém novo só para suprir a cadeira já conquistada.

Link no facebook: https://www.facebook.com/DevirSocial/posts/832231936977830

terça-feira, 3 de abril de 2018

Devir e a memória social

No Devir Social já foram escritos vários projetos com o objetivo de aprimorar a democracia. Dentre eles, o aperfeiçoamento do sistema jurídico, através da reformulação do tribunal de juri, e também um sistema de calibragem para os conselhos sociais. Espera-se que com estes dois projetos o cidadão comum possa colaborar com a democracia para além do voto, de modo a diminuir a eficácia de técnicas de manipulação em massa. Este texto pretende descrever mais uma destas ferramentas, cujo objetivo principal é desenvolver maneiras de aumentar a consciência de funcionamento estabelecido através das leis.

Uma visão simples do funcionamento das leis diz que, uma vez que elas sejam estabelecidas por uma sociedade humana, devem ser respeitadas e seguidas. No entanto, por experiência, sabemos o quanto é difícil um ser humano seguir uma lei cujo propósito ele desconhece. Portanto, o Devir pretende justamente refletir sobre formas de aumentar a consciência em torno das leis, para que assim a sociedade possa funcionar de maneira mais harmônica.

Inicialmente, sabemos que as leis são propostas por representante sociais escolhidos através do voto ou por mecanismos de expressão de vontade popular, como plataformas digitais ou lista de assinaturas. O devir acredita, no entanto, que a maior fonte de desenvolvimento de leis futuramente será os conselhos sociais, uma vez que eles lidaram diretamente com a sociedade através de trabalho voluntário.

No entanto, todo projeto político atinge a economia e a cultura, de modo que haverá oposição. Uma estratégia muito recorrente de toda oposição é invalidar o discurso daquele que está defendendo uma posição questionando a credibilidade da origem das informações. Ora, se a cada discussão política que uma comunidade enfrentar houver a desconfiança já na origem daquilo que se discute, como então poderemos construir qualquer diálogo?

É preciso, portanto, desenvolver formas de autenticar informações sobre os mesmo molde pelo qual foi construído o princípio de calibragem dos conselhos sociais: através da calibragem democrática. Ora, se uma notícia é vinculada e determinado grupo é privilegiado com ela, outro grupo será desprivilegiado. Se, afinal, houver desconfiança acerca da origem daquela informação, é preciso que os dois ou mais grupos desenvolvam maneiras de resolver tal conflito, autenticar aquela informação como verdadeira ou falsa, ou mesmo o quão verdadeira ou falsa ela é, para então registrar e servir como base para futuras discussões.

A constatação ou contestação daquela informação deve ser feita de maneira democracia, de modo que cada indivíduo possa manifestar sua opinião, se unir a grupos de opinião parecidas para que tal opinião possa ser trabalhada na validação da informação. Este trabalho, novamente, será voluntário, uma vez que a construção de uma fonte de informação validada é fundamental pra construção democracia, e aqueles que assim o farão, farão por dever democrático.

Uma vez que, de fato, tenhamos uma fonte de informação com chance de questionamentos desprezíveis, a lei então poderá não somente ser construída a partir de si mesma, mas com todo um plano de fundo que justifica e contextualiza sua existência e aberta para todo aquele que deseja se aprofundar nos aspectos históricos que fundamentam o funcionamento da nossa sociedade.

Fato é que o que fundamenta o funcionamento do direito é a história, e através deste processo de descrédito das fontes históricas, nossa história é minada de modo a descredibilizar até mesmo o próprio direito. Aquele que não tem interesse de participar da história, constando ou contestando uma notícia que será base para uma lei, não terá moral para, no futuro, fazer qualquer tipo de desmoralização da fonte de informação. Isto é um princípio importante, ao qual chamaremos de princípio do não interesse.

Através deste projeto, o Devir Social espera revolucionar a forma como as leis são vistas, uma vez que o sentido fundamental de uma lei não deve ser desenvolver mecanismos de prejuízo ou recompensa, de modo a manipular a população como seres robóticos, mas sim instigar a consciência de funcionamento geral de uma sociedade, de modo a gerar nas pessoas o dever de seguir a lei para que a sociedade se desenvolva com harmonia.

Link no blog: https://www.facebook.com/DevirSocial/posts/807672872767070

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Devir Social e o direito ao segredo

Uma questão confusa é quanto tratamos sobre os direitos e os deveres referentes a entidades públicas e privadas. Para lançar luz sobre uma possível solução a este tipo de confusão, o Devir Social gostaria de propor uma ideia básica, chamada de direito ao segredo. O direito ao segredo, para o Devir Social, é deve ser basicamente aquilo que separa uma entidade pública de uma entidade privada. Embora pareça um princípio simples, seus desdobramentos podem ser poderosos quanto pensamos a cerca da organização dos direitos da nossa sociedade.

Para iniciar, começamos definindo que, por ser público, o direito ao segredo é vedado ao estado, salvo em questões de ordem. Isto significa que todo o funcionamento do estado deve ser documentado e claro para que todo e qualquer cidadão possa exigir seu perfeito funcionamento. Obviamente, isto implica em um estado lento, no entanto, também implicará num estado que garantidamente funcionará. Afinal, se não funciona no papel, então cabe à sociedade civil organizar-se em torno da ideia de estado para conceber um que realmente funcione.

Outra consequência disto é que o estado será a base mínima de funcionamento da sociedade. Isto significa que todo conhecimento que garantidamente funcione estará implementado no estado, mesmo que este conhecimento seja obsoleto. Isto significa que, por exemplo, na área da saúde, deverá haver pessoas com os conhecimentos básicos de saúde de uma sociedade. Todos os procedimentos estarão devidamente protocolados e serão sustentados através do imposto, mas garantirão o mínimo de fornecimento do que for necessário para que o humano em sociedade sem que se queixe de que suas garantias básicas não estejam sendo atendidas. Afinal, se uma garantia básica é assim estabelecida, é porque ela é comprovadamente possível. Do contrário, ninguém pode exigir aquilo que não é possível.

Ora, sendo o estado vedado do direito ao segredo, é justamente através dele que definiremos as entidades privadas. Toda entidade privada tem direito ao segredo, salvo em questões de ordem. Desta forma, toda entidade privada poderá agir como quer, desde que cumpra o contrato social estabelecido entre ela e seu cliente. Do contrário, o próprio cliente poderá se revoltar e ele mesmo tentar algo contra a entidade privada, e isto não é um ambiente propício ao desenvolvimento social. Desta forma, toda entidade privada terá seu próprio modo de funcionamento, desconhecido a todos, e os princípios da livre competição poderão funcionar plenamente.

Em busca da máxima eficiência, é natural que as entidades privadas desenvolvam seus próprios métodos de fazer as mesmas funções que o estado. No entanto, uma vez que um segredo de alguma entidade privada for revelado e devidamente documentado, o estado e a concorrência terá o direito de se apropriar dele. Portanto, será necessário investimentos em segurança de informação para que este tipo de situação seja evitada. Assim, busca-se encontrar uma estabilidade em relação à atuação do estado e a concorrência entre as empresas.

O cidadão ficará livre para escolher se acessará aos serviços do estado ou os serviços privados, mas nenhum cidadão poderá se queixar de que suas garantias mínimas não foram atendidas. A inovação também ficará por conta do próprio estado, em busca da sua renovação trazida pelo próprio esquema democrático contemplado pelo Devir Social, como também pelas entidades privadas, que terão a sua disposição a liberdade para explorar seus recursos como quiserem, para descobrirem seus segredos que as deem vantagem com relação aos seus concorrentes.

As questões de ordem devem ser analisadas com cuidado para que não se tornem benéficas para um ou para outro. Serão verdadeiramente um acordo político que desenvolveram as estruturas de funcionamento da sociedade e sua relação entre público e privado, desenvolvendo uma identidade própria da região aonde atua, adaptando-se as suas características econômicas e culturais. São elas que vão decidir se algo público deverá ser secreto, ou se um segredo privado deverá ser investigado para que se descubra algo que não esteja nos contratos, mas que deveria estar.

Buscamos assim criar uma relação de harmonia de poderes entre o estado e as diversas entidades privadas de um país, sejam elas concorrentes ou não, de modo que o próprio poder tenha condições de inibir anomalias de outro poder. O estado terá uma estrutura garantidamente funcional, mas lenta, e em cima disso o privado agirá como quiser durante seu processo de concorrência, desde que não fira nenhuma questão de ordem, como por exemplo, produtos que prejudiquem a saúde sem o consentimento do consumidor. Assim, cada cidadão deverá zelar por tais regras, para ter um estado funcional, mas também garantir sua liberdade de escolha.